A História

Triste lição de experiência deixam
Os evos no passar, e os mesmos atos
Renovados sem fim por muitos povos,
Sob nomes diversos se encadeiam:
Aqui, além, agora ou no passado,
Amor, dedicação, virtude e glória,
Baixeza, crime, infâmia se repetem,
Quer gravados no soco de uma estátua,
Quer em vil pelourinho memorados.
Eis a história! — rainha veneranda,
Trajando agora sedas e veludos,
Depois vestindo um saco desprezível,
D'imunda cinza apolvilhada a fronte.
Se as virtudes do pobre não têm preço,
Também dos vícios seus a nódoa exígua
Não conspurca as nações; mas ai dos grandes,
Que trilham senda errada, a cujo termo
Se levanta a barreira do sepulcro,
Onde se quebra a adulação sem força.
Se virtuoso, as gerações passando
As cinzas lhe beijaram; se malvado,
Cospem-lhe afrontas na vaidosa campa,
Jamais de amigas lágrimas molhada.
E qual do Egito nos festins funéreos,
Maldizem bons e maus sua memória,
Lançando à face da real mumia
Dos crimes seus a lacrimosa história.
Talvez, porém, um infortúnio grande,
Um exemplo sublime de virtude,
Cobre dourada página, que aos olhos
Pranto consolador sem custo arranca.
Eis a história! um espelho do passado,
Folhas do livro eterno desdobradas
Aos olhos dos mortais; — aqui sem mancha,
Além golfeja sangue e sua crimes.
Tal foi, tal é: retrato desbotado,
Onde se mira a geração que passa,
Sem cor, sem vida, — e ao mesmo tempo espelho,
Que há de ser nova cópia à gente nova,
Como os anos aos anos se sucedam.
Ondas de mar sereno ou tormentoso,
As mesmas na aparência, que se quebram
Sobre as d'areia flutuantes praias.

Gonçalves Dias

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