Não há quem não feche os olhos

Não há quem não feche os olhos ao comer,
não há quem não feche os olhos ao cantar
a música favorita, não há quem não feche
os olhos ao beijar, não há quem não feche
os olhos ao abraçar. Fechamos os olhos para
garantir a memória da memória. É ali que a
vida entra e perdura, naquela escuridão mínima,
no avesso das pálpebras. Concentramo-nos para
segurar a dispersão, para segurar a barca ao calor
do remo. O rosto é uma estrutura perfeita do silêncio
Os cílios se mexem como pedais da memória.
Experimenta-se uma vez mais aquilo que não era
possível. Viver é boiar, recordar é nadar. Escrevo
na água, no vento da água. O passado sem os olhos
fechados é como uma roupa enrugada. Sem corpo.
Sem as folhas dos plátanos.

Fabrício Carpinejar

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